segunda-feira, maio 23, 2011

Um mês depois da tragédia

Cacilda M. Vieira Bruni*

No seu estudo “Projeto para uma Psicologia Científica”, Freud afirma que o desamparo inicial do ser humano é a fonte primordial de todos os motivos morais de comportamentos, dos princípios e valores que regerão a sua vida. Não somos como os animais que agem apenas movidos por instintos e alguns cuidados. Nós humanos necessitamos de cuidados especiais por muito tempo. Dependendo da maneira como somos recebidos e cuidados, vamos estruturar a nossa personalidade.

O relacionamento dos pais e os acontecimentos na família na época do nascimento marcam significativamente a criança para o resto da vida. Claro que ela traz sua herança genética, sua índole, mas o que ela recebe dos que com ela convivem formata a sua personalidade social. São índices que ela usará para agir no mundo.

No caso em questão, o bebê Welington nasce na rua como um animal sem dono. De início, já está em profunda desvantagem em relação à condição mais rudimentar possível. Porém, este ato é decorrência de

outro ato marcante. Quem engravidou essa mulher de rua, usuária de drogas? Tinha condição de ser responsável por seu ato? Tinha ela condições de assumir responsabilidade por suas consequências?

Não se trata de justificar. O que tentamos é compreender os fatos e suas causas, para encontrarmos meios, a nosso alcance, para que essa tragédia seja um fato único e não se repita. Embora a sua gestação e nascimento tenham passado despercebidos pela sociedade, esse bebê teve alguma sorte: uma mãe, com vários filhos, o adota. Trata-o com cuidado a ponto de seus filhos verdadeiros acreditarem que ele recebia mais atenção. A família lhe deu uma condição humana e o tratou nesse nível. Contudo, na instituição-escola, ele não teve a mesma sorte.

Esta não lhe deu amparo. Uma professora, em seu depoimento, disse que os colegas o “zoavam” muito. Ninguém lhe tomou a defesa para que lhe fosse assegurado o direito de ser respeitado e ter tranquilidade para estudar. No Estado do Rio de Janeiro, a legislação obriga as escolas a registrar esses casos e notificar a polícia.

Os pais responsáveis pelos alunos que praticam o “bullying” podem ser obrigados a pagar indenização por danos físicos e morais. A omissão é frequente por desconhecimento e/ou negligência. Nada disso justifica a tragédia e a barbárie ocorridas. Estas, porém, nos alertam para nossas responsabilidades. Este alerta diz respeito em primeiro plano à família. Freud disse que a certeza de ser amado fortalece o sujeito, mas também que a superproteção e o excesso, enfraquecem a subjetividade da criança.

Nada substitui a formação de valores transmitidos pela família. A escola deve assegurar os ensinamentos formais, inculcar e fortalecer o sentimento de cidadania que os alunos receberam e ampliá-los. O poder público deve dar condições às escolas para um funcionamento adequado e digno. Cada um de nós, em particular, deve assumir a responsabilidade pelo que nos cabe como família e como cidadão, no sentido de sermos mais humanos e civilizados. Nisto o MFC e o INFA cumprem sua missão cuidando das crianças e orientando as famílias.

*Psicanalista, integra o Movimento Familiar Cristão

Conselheira do INFA - Instituto da Família



Fonte Correio eletronio 263 de Helio Amorim

Nenhum comentário:

Postar um comentário